terça-feira, 6 de dezembro de 2011

A Mala Branca



                       Gelino Embrulhano entrou no boteco A Tijolada, legítima propriedade do Maçarico, na tarde de terça-feira e foi logo ordenando:
        - Põe pra mim o que eu mais gosto e que pelas leis cármicas do universo estão a mim reservadas.
        Maçarico que, de costas para o balcão lavava alguns copos enquanto ouvia a conversa, em tom de sussurro, entre Van Grogue e Donizete Pimenta, voltou-se para o freguês recém-chegado e, com maestria, encheu um vaso com pinga, abrindo em seguida uma garrafa de cerveja.
        Ao entrar Gelino não cumprimentou ninguém. Geralmente ele não olhava Grogue nos olhos; considerava-o um chato metido que gostava de aparecer.
        Na verdade Gelino tinha muita inveja do Van de Oliveira e os comentários que faziam desse biriteiro, mais conhecido de Tupinambicas das Linhas, perto dele – do Embrulhano -, deixavam-no muito quebrantado.
        - É verdade que você vai instalar um ar condicionado aqui no boteco, Maçarico? – inquiriu Embrulhano logo depois de emborcar a vasilha de aguardente.
        Maçarico asseava o tampo do balcão com o guardanapo alvo; antes de responder a pergunta, ele parou, tirou a caneta que trazia sobre a orelha direita e, anotando alguma coisa num caderninho respondeu:
        - Mas veja você que eu vou colocar um aparelho de ar condicionado nesse ambiente. Isso é pra quem vive numa sala fechada, pra quem se sente muito mal com o calor. Geralmente são pessoas gordas que passam a maior parte do tempo sentadas, conversando. Aqui não existe essa moleza não.
        - Mas percebo que você tem novidades no ambiente. Apesar de pequeno, limitado, apertadinho, você agora decora as paredes com figuras sugestivas. Tem até um mapa do Estado de S. Tupinambos com tachinhas fincadas nas cidades da redondeza. O que significa isso?
        - As tachinhas amarelas significam os locais de onde vèm os produtos que vendo aqui no boteco. As azuis estão fincadas nos lugares onde tenho mitos parentes, que de vez em quando, vêm me visitar, e as brancas estão onde existem os sanatórios pra onde eu mando os chatos que nem você.
        Gelino Embrulhano engasgou e parou momentaneamente com a ingesta da cerveja. Van Grogue então disse:
        - O Donizete Pimenta me contou que você matou um gato. É verdade Embrulhano?
        - Eu sozinho não. Esse porco ai do seu lado, também conhecido como Donizete, participou da malvadeza. – reagiu Gelino.
        Donizete Pimenta começou então a contar a história:
        - Eu não conseguia dormir durante a noite por causa de um gato que miava por horas e horas seguidas. Era toda noite aquele inferno. Eu não tinha sossego; quando estava passando pro sono, pronto, lá vinha aquele gato me encher o saco. Ele ficava no telhado do vizinho e parecia perseguição.
        - O bichano era do dono da casa onde você “buraqueava” as filhas dele tomando banho. – entregou Embrulhano.
        - Como assim? – quis saber Van Grogue.
        - É sim. O Donizete Pimenta, quando ouvia o barulho do chuveiro da casa do vizinho, subia no muro e olhando o reflexo do espelho do armário do banheiro, assistia as meninas tomando banho.
        - Mas que pouca vergonha, hein seu Donizete? – proferiu em tom de repreensão o Maçarico.
        - Ah, mas isso já faz muito tempo. – justificou Pimenta, bebendo em seguida, um gole de cerveja.  
        - Foi ai que apareceu o gato. – informou Gelino Embrulhano.
        - Nossa! Acabamos com ele. – confirmou Donizete.
        - Numa noite, durante os miados, esse vadio xarope, chamado Pimenta levantou-se, pegou a mangueira de água e encharcou o pobre bicho, que estava preso lá em cima, sobre um caibro, entre a parede e o telhado.
        - E não satisfeito, entrou no quarto trazendo em seguida uma espingarda de pressão. – continuou Embrulhano.
        - É verdade. Enchi a cara dele de chumbo. – confessou Donizete Pimenta.
        - Depois pegou o corpo do infeliz pelo rabo e, com a maior cara de nojo, jogou-o no bueiro da esquina. – concluiu Gelino Embrulhano.
        - Deve ser por isso que os bueiros do Rio de Janeiro e São Paulo explodiram machucando tanta gente. – Concluiu Maçarico com os olhos arregalados.
        -É. Só podia ser o espírito do gato clamando por justiça. – arrematou Van Grogue.
        Os homens se entreolharam amedrontados.
        Logo em seguida parou defronte ao bar um novíssimo e luxuoso carro branco. Era Luísa Fernanda que vinha comprar o seu primeiro maço de cigarros do dia.

Mudando de assunto: vamos passear com o Buick 1963?
 

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