segunda-feira, 27 de maio de 2013

O Motorista e o Vereador



Se o sujeito é analfabeto, como pode ter carteira de habilitação? A resposta "se um analfabeto pode ser vereador, por que não poderia dirigir automóveis?" não vale.
É que um vereador, por mais "tapado" que seja, ao cometer seus enganos, em tese, não poria em risco a sua vida e nem a de terceiros, com a mesma gravidade com faz o motorista, que não distingue os sinais de trânsito.
O cidadão para habilitar-se a dirigir veículos, além das aulas teoricas, a fim de inteirar-se do significado das placas e sinalizadores existentes nas ruas e estradas, precisa também passar por testes práticos.
Mas se o cara é analfabeto, como pode participar desse tipo de aprendizado?
Não difere muito, na interpretação dos sinais, o cidadão que  tem como seu, o dinheiro destinado às obras no município, daquele que não distingue o significado das placas de trânsito, violando assim direitos alheios.
No primeiro caso, (o do cidadão que leva consigo, para a sua conta bancária, as verbas do município), o crime cometido é contra a coletividade, o povo. Já no segundo exemplo (o do motorista que confunde as placas), os prejuízos são praticados contra particulares.
Mas nos dois casos, o bandido ¨"misturou as bolas", violando o direito de terceiros.
E pode o meu amigo leitor perceber que os "distintos" sabiam o que faziam quando praticavam os delitos. Quando o sujeito embolsa, por exemplo, R$ 80 mil da administração, não se pode dizer que ele o fez por engano, por equívoco. Não haveria como negar a intenção de praticar a maldade.
Já no caso do motorista, que entra numa via preferencial, sem obedecer a placa "pare", pode praticar o dano material e lesões corporais por culpa mesmo. 
Tanto na apropriação indébita, quando nos danos materiais, os infratores devem ser pedagogicamente punidos com as sanções socioeducativas previstas nas leis.
A impunidade gera o incentivo para as praticas de novos delitos e contribui para a desmoralização do ordenamento jurídico. 

quinta-feira, 16 de maio de 2013

A Boca Babenta



O ônibus interestadual entrou nos limites da cidade do Rio de Janeiro durante a madrugada de sábado. Fazia frio dentro do veículo, mais por causa da exigência das janelas fechadas, que requer o ar-condicionado ligado incessantemente, do que pela temperatura natural do território.

A quase 10 minutos antes da parada final, alguns passageiros já se preparavam para o desembarque, guardando cobertores nas mochilas e malas.

As luzes da cidade passavam céleres e, às vezes, uma desaceleração abrupta, ante um semáforo ou outro, dava a impressão de que a pressa do motorista faria com que a viagem, de tantas e tantas horas seguidas, não terminaria muito bem.

Eu já previa dificuldades, durante a minha estadia ali no Rio, por não ter planejado absolutamente nada daquele ato maluco de sair bestamente assim, de São Paulo, no impulso, com a cara e a coragem.

Os passageiros formavam uma fila no corredor, aguardando a vez para descer, quando o ônibus parou finalmente na rodoviária Novo Rio.

Ao colocar a mochila nas costas e olhar através de uma das janelas, vi um sujeito mal-encarado observando o pessoal que descia.

A figura levava frequentemente a mão à boca e aspirava com força o cigarro fumacento. Notei que ele vestia uma camiseta azul com a inscrição 1905 em amarelo, na altura do peito.

Eu não tinha nada planejado e não sabia o que fazer. Tomar um taxi? Sim mas para onde? Uma cama bem macia de hotel resolveria os mal-estares provocados pelo desconforto da viagem. Mas qual?

Eu vacilava enquanto os demais passageiros dispersavam seguindo seus destinos. Não tenho certeza, mas acho que o cara percebeu minha hesitação e aproximou-se. Por ser muito mais alto do que eu, o fulano olhou-me ostensiva e ameaçadoramente de cima para baixo.

- Você tem algum problema comigo? - perguntou o malcheiroso com sotaque castelhano, soltando, em seguida, uma baforada de cigarro no meu rosto.

Eu fiquei espantadíssimo com a cena, mas considerei que o estranho poderia não estar no seu juízo perfeito e, por isso mesmo, num ato de doideira, praticaria  alguma violência.

- Eu não. Eu nem te conheço. Como é que teria algum problema com você?- respondi-lhe.

- Eu tenho seis filhos pra sustentar - disse o sujeito como se tal fato pudesse justificar qualquer ato agressivo da parte dele.

- Sim, tudo bem. Mas o que é que eu tenho com isso? Você não pode sair por ai chutando as pessoas por causa dos seus desejos.

- Você está na minha frente, no meu caminho, e eu quero que você suma daqui - afirmou raivosamente o gringo.

Bom, eu fiquei em estado de alerta e me preparava para reagir ou cair fora o mais rápido possível, quando o maluco, depois de se afastar alguns metros, voltou correndo, lançando-se com os dois pés no meu peito.

Caído no chão eu ainda pude ver quando o camarada se aproximou preparando outra pancada.

Eu que já esperava outros golpes buscava, no bolso da calça, alguma coisa com que pudesse me defender, quando alguém acertou violentamente a cabeça do valentão. Atingido, o agressor caiu desmaiado, com a boca babenta.

Para a minha surpresa vi que a minha salvação viera por meio de uma garota vigorosa, de esvoaçantes cabelos castanhos com mechas brancas.

A menina trajava short preto, camiseta roxa e coturnos. Quando ela estendeu a mão, para me ajudar a levantar, vi no seu dedo anelar direito, um anel enorme com a imagem de um gavião.

- Seja bem vindo ao Rio de Janeiro - disse-me a menina ao tomar o celular chamando um taxi. 

É meu amigo… Quem negaria que a vida continua? Percebi que guardaria eternamente aquela menina no meu coração.


quarta-feira, 15 de maio de 2013

Burro que nem uma porta





Só mesmo a deficiência intelectual, consequência dos equívocos genéticos sérios, explicaria a incapacidade que algumas pessoas teriam, para compreender que estariam redondamente erradas, ao não obedecerem a legislação vigente.

Antigamente, quando a pessoa era "dura de entendimento", dizia-se "fulano é burro que nem uma porta". A porta tem muito disso, de ir e vir, sem nunca sair do mesmo lugar.

Ou seja, todos explicam, ou tentam explicar para o sujeito que ele, pra fazer determinada coisa, na sociedade, precisa suprir esta ou aquela exigência, providenciar este ou aquele documento, mas o mentalmente prejudicado, não consegue assimilar o conceito, promovendo, por causa disso, muita agitação. 

A família inteira entra na balburdia tentando adivinhar, com palpites mil, o que fazer pra sair da tal sinuca de bico.

Até o tiozinho gay que, não contendo os chiliques histéricos, diria ao sair correndo da reunião improvisada dos parentes:

- Socorro, que meu feijão vai queimar!

Mas falando sério... A irracionalidade chega a ponto de transformar a própria omissão, ou mesmo negligência, no cuidado dos trâmites burocráticos, em culpa de quem não tem nada a ver com a quizumba.

Esse tipo de estupidez mental pode transformar-se em tijoladas desferidas nas esquinas, tentativas de agressão física, e maledicências.

O problema é que, em havendo "autoridade pública", tipo vereador oportunista e despreparado que, assumindo a quizila, pode comprometer-se, ao tentar dar os seus jeitinhos.

Sabe-se que a somatória dos tais jeitinhos termina, não raras vezes, em tragédias como aquela de Santa Maria, no Rio Grande do Sul. `Por isso além de, com o devido respeito, "queimar o filme" do tal político, os jeitinhos, com certeza, comprometerão a boa fama, que por ventura possa ter o partido.

Agora, quem é que explica, para os cabeças-duras, que não adianta espernear, murmurar ou maldizer?

Se o interessado não consegue safar-se dos entraves burocráticos, por absoluta ausência de tino, como poderia oferecer serviços de boa qualidade para outrem?

Não agiria com bom senso o sujeito que, ao invés de reclamar, queixar-se e maldizer a própria sorte, tentasse suprir, com muita calma naqueles balcões, as exigências das posturas municipais?

Olha... Tem muita gente que considera aquele antigo adágio popular, aplicável ao caso, "quem muito fala pouco faz"  acertadíssimo.

Eu também.

quinta-feira, 9 de maio de 2013

Balburdia





 - É verdade que fecharam o bar do Maçarico? - perguntou ansioso Van de Oliveira Grogue, ao se aproximar atordoado da Dina Mitt, que saboreava a sua segunda cerveja, no boteco do Bafão.
- Van Grogue, seu focinho de porco desalinhado! Você não é caspa, mas também não sai da minha cabeça. - reagiu a mulher sentindo alegria ao ver o parceiro de copo.

- Eu não acredito que você já se encharcou. Você soube do Maçarico? - quis saber Grogue sedento também de notícias.

- Fecharam a baiuca do cara. Também… Não tinha alvará, não tinha autorização pra nada. Como é que poderia funcionar uma espelunca daquelas sem causar danos às pessoas? - antecipou-se o Bafão adiantando as novidades ao Grogue.

- E depois tem mais: Eu mesma presenciei muita sujeira naquele salão; muita sacanagem e vi até que acendiam velas pro capeta atrás da porta do banheiro. - confirmou a Dina Mitt.

- É sim. Os caras da prefeitura baixaram em peso no boteco mais mal falado do bairro. Maçarico levou cada multa que não sei se ele consegue pagar. - disse Bafão limpando o tampo do balcão com o seu guardanapo alvo.

Grogue fez-lhe o sinal de que queria uma cerveja enquanto dizia:

- É uma vergonha pra comunidade esse tipo de gente. O Maçarico é um mau elemento. Dizem que ele não pagava os funcionários. Que vinha gente de fora pra ajudar no serviço, mas ele não registrava em carteira, não depositava o fundo de garantia e nem recolhia o INSS. Os empregados trabalhavam a troco de pinga, cigarro e cerveja.

- O bairro inteiro esperava essa atitude da prefeitura. Teve gente que foi falar diretamente com o caquético testudo. Apesar de não acreditarem que ele mandaria cumprir a lei, ele mandou o pessoal averiguar e pronto: confirmaram as irregularidades - falou Bafão servindo a cerveja ao Grogue.

- Sabe o que eu ouvi dizer? - indagou Dina - Disseram que o Maçarico e a mulher dele, sabe aquela retardada mental, que catava latinha de cerveja na rua e que depois amigou com ele? Então… Contaram-me que foram reclamar pro bispo que eles eram perseguidos.

- Mas como perseguidos? - quis saber Van de Oliveira Grogue. - Eles devem se adequar à lei. Se a lei manda pagar as multas e os impostos, então devem fazer isso.

- É que eles são ignorantes. Idiotas. E você sabe: gente assim pensa diferente. Pra começar não sabem ler. Como é que a comunidade pode esperar coisa boa de gente que mete os pés pelas mãos? - questionou Dina Mitt.

- É. O Maçarico é bem retardado. Se disserem pra ele que botar fogo no boteco dá direito a seguro, ele é capaz de incendiar tudo.

- Eu sabia que ele era "mental", mas não acredito que ele seja capaz de fazer isso. - duvidou Van de Oliveira Grogue.

- Não duvide. O pai do Maçarico era demente também. Louquinho de pinga. Numa ocasião, no meio da madrugada, ele saiu na rua deserta, e começou a disparar o revólver. Os vizinhos se apavoraram. Mas teve um corajoso que se aproximou, bem devagarzinho, e perguntou ao cara o que estava acontecendo. Sabe o que ele respondeu? Respondeu que tinha um ladrão tentando roubar o carro do vizinho - contou Bafão.

- Mas e daí? - quis saber Van de Oliveira.

- E dai que quando disseram pro maluco que nem o carro e nem o vizinho estavam ali, o demente envergonhou-se parando com a balburdia. Mas voltou pra cama resmungando.

- É só em Tupinambicas das Linhas que isso acontece - definiu Dina Mitt. - Mas vem cá: O Maçarico não tinha uma cadela Poodle que latia a noite inteira infernizando a vizinhança?

- Não. Quem tinha um demônio desse era o Célio Justinho, casado com a Luísa Fernanda, aquela gerente de banco que precisou de treinamento intensivo durante um ano, quando a direção trocou a cor das guias que ela deveria carimbar diariamente.

- Gente… Vocês não sabem o que aconteceu - gritou esbaforido Donizete Pimenta ao entrar correndo no boteco.

- Fala o que aconteceu criatura careca e cabeçuda - exortou a Dina Mitt alarmada.

- A polícia acaba de chegar no bar do Maçarico. Pararam bem na porta e deram voz de prisão pra ele. Quando os homens chegaram ele estava lendo um jornal na porta do estabelecimento. Confirmaram que ele roubava carros no bairro vizinho. - concluiu Pimenta arfante.

- Lugar de bandido é na cadeia - garantiu Van Grogue.

- Bandido bom, é bandido falecido - respondeu Dina Mitt.

Alguém duvidaria?